Compliance Tributário

Compliance Tributário: busca da perfeição ou melhoria contínua e prevenção de perdas?

4 de abril de 2024

O Compliance Tributário é uma expressão que define um conjunto de práticas de negócio que visam o cumprimento da legislação tributária por uma organização em todos os seus níveis, e é parte fundamental de um bom processo de gestão estratégica de impostos.

O cumprimento da legislação compreende a adoção correta das alíquotas, bases de cálculo, períodos de recolhimento corretos e também do cumprimento das diversas obrigações relativas à emissão e escrituração de documentos fiscais e de informação aos órgãos de fiscalização nos seus diversos níveis. 

No Brasil, uma empresa precisa atender a normas federais, estaduais e municipais. Deve, portanto, monitorar o cumprimento por todas as áreas da empresa, desde a formação do preço à entrega do produto ou serviço, de todas as normas fiscais aplicáveis. 

Esse cumprimento correto das normas é exigido não só pelas autoridades por meio de fiscalizações físicas e digitais, como também por clientes e fornecedores, que podem, por exemplo, se recusar a receber ou enviar determinando bem caso entenda que sua tributação não está correta. 

O não atendimento das exigências legais pode, portanto, resultar em perdas de negócios ou em débitos inesperados e multas por infrações fiscais. Essas consequências são danosas para executivos, que podem ter suas metas afetadas por perdas inesperadas, e por acionistas que acabam por perder a visibilidade real de suas margens, seus retornos e da performance do negócio e da administração. É aí que entra o Compliance Tributário.

A ação de uma empresa reconhecidamente séria no cumprimento de suas obrigações fiscais certamente recebe um prêmio de mercado em relação a empresas com problemas conhecidos e históricos negativos nesse assunto. 

Existe Compliance Tributário 100% (cem por cento) correto? Devo buscar isso em meu negócio? 

Atualmente, dada a quantidade de normas e procedimentos e campos a serem preenchidos, é realmente muito difícil o cumprimento de todas as exigências fiscais. E mesmo que uma organização conseguisse em algum momento tal feito, possivelmente o fisco municipal ainda poderia divergir do federal ou do estadual, por exemplo, quanto à classificação de um serviço ou mercadoria ou quanto à incidência de ITR ou IPTU. Ou seja, Compliance Tributário 100% correto é praticamente impossível.

Nesse contexto, é importante ter como objetivo a melhoria contínua e tendo como objetivo o cumprimento mais adequado possível das exigências sem deixar de levar em consideração as necessidades da operação e as restrições de recursos financeiros. Na prática, isso pode significar eventualmente ter que executar um processo manualmente de forma temporária até a subida de uma determinada atualização do ERP, por exemplo. 

Um negócio sério e saudável comporta, portanto, o fato de não conseguir ser 100% aderente a todas as regras tributárias o tempo todo. O que o Compliance Tributário deve procurar cumprir totalmente e combater é a existência de riscos materiais não geridos de possíveis passivos tributários que não tenham sido avaliados e comunicados devidamente aos responsáveis pela organização, como auditores, administradores, board, o conselho e acionistas. 

Essa tarefa no Brasil é especialmente desafiadora em razão da dinâmica própria dos passivos tributários e da complexidade operacional. Em um caso, você pode estar diante de um risco assumido pela maioria de seus concorrentes relevantes, e não corrê-lo pode significar ficar de fora de um mercado. 

E, não fosse o suficiente, um parâmetro errado de faturamento ou recebimento em um volume de dezenas de milhões pode representar uma perda cujas penalidades também têm potencial para comprometer o retorno de um negócio inteiro. 

Compliance Tributário: como implementar, manter e melhorar?

O nível de conformidade de uma empresa a normas tributárias deveria ser o mesmo em todos os ramos de atividade ou tamanhos de operação. 

O que acontece, entretanto, é que, em razão da complexidade e dificuldade de se atender  todas as normas, empresas menores acabam tendo níveis mais baixos de conformidade do que empresas maiores.

Na prática, empresas maiores sofrem um maior grau de fiscalização e também possuem mais recursos para investir no cumprimento das obrigações

Independente do tamanho e do nível de complexidade, é fundamental que os administradores, analistas ou donos sejam capazes de conhecer as principais obrigações fiscais a que seu negócio está obrigado. Além disso, é saudável que conheçam os riscos próprios de seu mercado e modelo operacional, e sejam capazes de tomar decisões de negócio levando-os em consideração e de administrá-los posteriormente. 

Com esse contexto em mente, aí vão algumas dicas práticas de como construir um processo de Compliance Tributário para navegar com habilidade as particularidades da tributação no Brasil.

1. Mapeamento de Riscos e Definição de Controles Chaves

O primeiro passo para se construir um processo de Compliance Tributário é o mapeamento dos Gaps e Controles Chaves. 

Controles chaves são ferramentas ou processos de um negócio que tem como objetivo o monitoramento do cumprimento de determinada exigência tal como o pagamento de um tributo, envio de uma declaração ou a escrituração ou tratamento de 100% das notas fiscais emitidas com uma empresa. 

Já os Gaps são situações ou processos que não estão de acordo com uma determinada norma e podem vir gerar multas e juros indesejados, além de custos ou gastos não previstos e, por isso, não repassados nas margens da empresa.

Além de controles chaves a gestão de riscos traz ainda os conceitos de significant deficiency e material weakness, cujos detalhes estão bem resumidos aqui

2. Gestão de Controles Chaves (key controls)

A partir da definição dos controles chaves e aprovação com órgãos competentes da gestão da empresa, a administração deve implementar uma agenda de acompanhamento desses controles chaves e reporte sobre sua saúde a investidores e demais stakeholders.

Para isso, é importante que se definam, por exemplo:

  • Tipo e escopo de cada fórum
  • Áreas que devem estar representadas e pessoas que devem participar
  • Formato de acompanhamento das ações
  • Frequência de reunião
  • Gatilhos que disparam ações e comunicados

A adesão a esses fóruns, a disciplina com que os gaps são endereçados e a qualidade e confiabilidade da comunicação dos riscos são aspectos chaves para bons resultados.

3. Papéis e responsabilidades

Os riscos fiscais podem ser impactados por diversas áreas da empresa. Eles podem ser causados:

  • pelo próprio financeiro, responsável quase sempre pela contabilidade e apuração;
  • pelo contas a pagar, que pode não pagar uma guia;
  • pelo jurídico, que pode dar uma opinião equivocada sobre algum tema judicial;
  • pelo comercial, que adota uma prática de preço agressiva;
  • pela logística que autorizou a entrada de um caminhão sem a nota fiscal autorizada na Sefaz nacional. 

Diante disso, uma missão difícil é a de definir o responsável pelo Compliance Tributário, pergunta cuja resposta pode variar conforme o tamanho da empresa, a relevância de cada área na administração do risco ou mesmo o perfil de cada pessoa em sua respectiva posição. 

Alguns processos terão ainda a sua gestão e tomada de decisão compartilhada ou colegiada. Em algumas empresas, decisões sobre riscos superiores a determinados valores são tomadas por mais de uma área em conjunto, como Jurídico e Financeiro. 

Em certos portes, o Compliance é responsabilidade do analista, coordenador financeiro ou contador e em outros portes, há um especialista apenas para tributos em uma gerência específica para controles internos.

E por último,  é possível que uma determinada área, como a Contabilidade, seja responsável pela gestão dos controles por ser a que mais possui atuação, ou esse pode ser o motivo pelo o qual uma outra área supervisiona a saúde dos controles chaves tributários. 

O que importa é que haja um esforço genuíno dos acionistas e da alta administração da empresa em discutir, dar relevância e recursos para o processo de Compliance Tributário, que além dos impactos econômicos para a empresa, pode gerar responsabilização dos próprios executivos. 

4. Melhoria Contínua e automação

A melhoria contínua, como visto, é o melhor e talvez o único caminho para uma gestão sustentável de controles internos no Brasil. 

E como aliado, a empresa deve contar com investimentos em tecnologia TRANSFORMACIONAL

A área tributária é fonte de custos e investimentos relevantes todos os anos pelas empresas. Mas esses investimentos ocorrem apenas para o cumprimento de exigências legais que, de tantas e tão complexas, acabam por fazer com que as soluções adotadas sejam as mais baratas num primeiro momento, mas que se mostrem demandar mais mão de obra no futuro. 

Para se caminhar no sentido do Compliance Tributário é quase que imperativo que empresas invistam em melhorias TRANSFORMACIONAIS

Muitas vezes, vemos empresas investindo milhões em um ERP de primeira linha quando seus funcionários não possuem sequer um notebook com capacidade e memória adequados para manipular as planilhas que usam em seus processos de trabalho. 

Em outros casos, os sistemas são caros, mas pouco aproveitados porque o orçamento acaba na hora de customizar uma transação para uma rotina fiscal que pode reduzir a dependência de planilhas e trazer segurança ao processo. 

Por isso, a verdade dura é que sim, as empresas precisam investir para cumprir obrigações, mas precisam também pensar constantemente em como seus funcionários podem trabalhar melhor em atividades que geram mais valor.

Leia este artigo sobre Tax Transformation e como a tecnologia aplicada à área de tributos afeta autoridades fiscais e empresas.

Se esse texto te ajudou a escolher um caminho ou propor uma solução para sua empresa, ou se te ajudou em um trabalho acadêmico ou mesmo apenas na sua formação geral, curta, comente e compartilhe com outras pessoas que também podem aproveitar a mesma ajuda que você teve.

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